sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Prática do Desapego


As vezes uma inocência qualquer faz nossa satisfação nos ajustar em algum poço escuro, e ali alimentamos e mantemos aquecida nossa inocente visão de mundo (uma não-visão das coisas).
De fato, nos tranquiliza quando estamos convictos e realmente certos de que não somos detentores de um problema de ordem conjugal – é o estado natural das coisas: aquilo que devia ser, e que para muitos, não é.
A sociedade que você enxerga pela janela da sua casa te impõe uma pressão feito panela borbulhante onde o refogado é o seu cérebro: cuidado com o que ele/ela está tramando.
Alguma teoria e alguma conspiração a mais, para tornar empolgante nossa viagem pelo mundo.

“Como ciumento sofro quatro vezes: porque sou ciumento, porque me reprovo por sê-lo, porque temo que meu ciúme fira o outro, porque me deixo sujeitar por uma banalidade: sofro por ser excluído, por ser agressivo, por ser louco E POR SER COMUM” (*)

No mais, precisamos mesmo cuidar de quem somos, e estou certa de que quem estará conosco fará parte deste cuidado, e não precisaremos de grandes esforços para confiar.
Existem tantos exemplos tristes, por que vamos construir mais um? E outra... basta ser seletivo na hora da escolha – desespero atrai desespero.
E sobre confiança, sobre se envolver cegamente em um apego aparentemente tão real... entre tantas maneiras de aproveitar a polemica, aproveito o assunto:

“Não é que todos os homens irão trair, mas estão mais propensos a isso.”

Oh! Que coisa bonita de se dizer! Que coisa mais confortável de se ouvir!
E então agora nós cruzamos os dedos e rezamos para que os Nossos não estejam nessa listinha dos que são propensos e traem.
Preferimos então os que são simplesmente propensos, né? Que vão imaginar as possibilidades do mundo, quiçá visualizem pensamentos e coisa e tal, e continuem aumentando o número de visitas dos sites de arquivos XXX - mas não é nada não, eles precisam disso porque são humanos, é parte da essência deles, coitadinhos (infelizmente). E nada de contestar!

E um pensamento dá a mão para outro pensamento, e lá se vai, correndo, uma sequência de sinapses super violentas acerca dessa temática...

Se somos inseguras?
Nem por isso!
Pode ser que ele traia, pode ser que esteja te traindo agora (não necessariamente da maneira que a novela das oito mostra), enquanto você lê este blog esclarecedor, afinal, as possibilidades são imensas, mas também pode ser que não... e por existir esse ínfimo número nas porcentagens malucas das cabeças deles, então, não parece valer muito se preocupar! As pessoas se enganam e se acomodam, mas você (vocês) sabe o caminho que está seguindo...

Se a namorada trai o namorado com o melhor amigo dele, então, ela é a malandra e o amigo é o amigão por ter aberto os olhos do namorado corno, mostrando que a namorada era traidora e não prestava (afinal, se traiu com o amigo, pode vir a trair com qualquer um, em qualquer circunstância o fato do amigo do namorado estar perto apenas facilitou as ações)? E continuarão amigos a beça – nem cogitando o fato do amigo também ser traidor?
Ahá! É! Ai ai...

Se o namorado trai a namorada com a melhor amiga dela, então, essa amiga é mesmo uma vigarista, não sendo digna da confiança do namorado traidor porque, se traiu a amiga, pode trair qualquer um, né?
Provavelmente os homens dirão isso.
Mas, eu disse confiança?
Não, claro que não. Impressão nossa...

“Odeio quem me rouba a solidão sem em troca oferecer verdadeiramente companhia.”
(Nietzsche)

(Então, por sabermos que os homens são mais propensos a trair, então eles tem pontos a mais que as mulheres, sendo uma ação natural e digna de nenhum espanto, ganhando uma espécie de 'carta branca'?... E quando elas, criaturas que estão mais propensas a não trair, resolvem imbecilmente trair, são condenadas, e a sociedade apedreja com comentários de senso comum e ignorância? Sempre aparecem juizos e alguem ostentando alguma moral ou frase feita).

E daí saem várias histórias que ‘Deusolivre’ pensar agora... E nem precisamos disso.

O ser humano me envergonha.
Tem um livro muito bom... chama-se “Amor Líquido” - Zygmunt Bauman.
http://www.livrariacultura.com.br/scripts/cultura/resenha/resenha.asp?nitem=758638
Leiam, e leiam tudo, e os outros.

Eu gostava quando não pensava nisso, e gosto de pensar que posso continuar não me preocupando com isso (por isso amo meu amor, muito gigante). E não se fala mais nisso!!!!!!

“Algumas vezes acontece-me suportar bem a ausência. Sou então “normal”: alinho-me ao modo como “todo mundo” suporta a partida de uma “pessoa cara”; obedeço com competência ao adestramento através do qual muito cedo acostumaram-me a ficar separado da minha mãe – o que não deixou, contudo, na origem, de ser doloroso (para não dizer: desesperador). Ajo como sujeito perfeitamente desmamado; sei me alimentar, enquanto espero, de outras coisas além do seio materno.
Essa ausência bem suportada nada mais é do que o esquecimento. Sou, intermitentemente, infiel.
Esta é a condição de minha sobrevivência; pois, se não esquecesse, eu morreria. O amante que não esquece algumas vezes morre por excesso, cansaço e tensão de memória (como Werther).
(Menino, eu não esquecia: dias intermináveis, dias abandonados, em que a Mãe trabalhava longe; eu ia, á noite, espertar sua volta no ponto do ônibus Ubis, em Sèvres-Babylone; os ônibus passavam uns após os outros, e ela não estava em nenhum).” (*)

Vem a conclusão:
A prática do desapego consiste em pensar nos fatos que nos rodeiam, conscientemente, principalmente na questão de que o sujeito que está conosco em parceria afetiva, ou todo e qualquer outro sujeito do mundo, é humano e tem suas particularidades - sejam virtudes ou pormenores desagradáveis de imaginar - e então passamos a acreditar que estar acompanhado de quem somos é a melhor opção!


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(* BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso. São Paulo: Martins Fontes, 2007. – Páginas 69 e 37, respectivamente)
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(A base para estas divagações foram devidamente memorizadas e internalizadas a partir de conversas informais com meu amor, cuja opinião é bastante crítica, e seus argumentos bárbaros... e eu não sou absolutamente feminista, nem machista, nem fria, nem romantica... mas gosto de fazer piadas com/contra este propósito).

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