quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Sobre um sentido

Curioso como o silêncio absoluto nos faz pensar mais.
Os sons do dia tomam nossa atenção, deixam as ideias equivocadas. Ora um pensamento, ora outro, e então um barulho horrível ou uma música breve, e linda, ou então é o café que está frio, e alguém chama, ou alguém não chama nunca.
E o silêncio comove, e ouvimos o coração bater.
Além do silêncio, solidão.
E a chuva, claro, e o fato de ser três da manhã.

Dizem por aí, ali e em qualquer lugar, que temos de superar nossos medos para então conseguirmos realmente dançar conforme a música de nossa existência. Música para nossa existência, suave e com ritmo marcado, como um coração em pulso definido.
Apertado.
Os medos são criados nas situações mais óbvias, e as músicas ouvidas nos mais apropriados instantes.

Mas para ouvir, de fato, a música tão sonhada (para um estudante, o diploma merecido; para um amante, um sim depois de um pedido; para um cozinheiro, um elogio pela doce sobremesa - comoções estão a cada dia redefinidas), é preciso preparar-se.

Um preparo, como uma guerra.
Você investe tempo. Dinheiro. Lágrimas. Lágrimas. Pensamentos. Idas, vindas, trocas de ideias, silêncio, companhia, solitude. Lágrimas. Oscilações. Tempo. Teorias, dúvidas, certezas. Reflexões, conclusões.
Torna-se um chato. Ou evidencia o quão chato sempre foi, e sempre vai ser.

Então, em pormenores, o inimaginável surpreende. Cada coisinha miudinha, torna-se imensa.
Como olhar-se no espelho e reconhecer-se em uma versão melhorada, absolutamente, inclusive ser capaz de enxergar quem você realmente é, e orgulhar-se de quem se tornou, nutrir-se de uma coragem que aquece o espírito. Como reparar em uma frase do livro que nem o escritor pode ter ideia de que aquilo ali dito foi fundamental para alguém. Como ver uma cena de um filme e, ... e não saber o motivo exato de estar abalado, e esquecer-se do filme para partir em busca de alguém que ficou confuso lá no aperto que se formou no coração, mas ter as frases todas preparadas para resolver o problema, como sempre acontece. Resolver o problema.

Ainda o preparo para a guerra. Cotidiana.
Mas a mais, as munições são carregadas com uma força que, de estalo, talvez, foram postas ali no devido momento, mas uma força que podia ser diferente. Podia ser natural, podia conter sorrisos - mas foi o inverso.
E se parar um instante, fechar os olhos, uma melodia adequada canta em seus ouvidos, provoca um arrepio, nos pega pelas mãos e quando sentimos que os pés não tocam o chão, lembramo-nos da realidade que vivemos.

A guerra de superação. Quando realmente faz questão daquilo.
Será? Será que realmente faz questão? E por que isso sempre nos faz temer?
A guerra não termina enquanto ainda restarem dúvidas, e medo.
O nosso mundo individual precisou e vivencia conflitos sempre, é curioso. E sempre em alerta.


"Então, minha querida Amélie, não tem ossos de vidro. Pode suportar os baques da vida. Se deixar passar essa chance, com o tempo seu coração ficará tão seco e quebradiço quanto meu esqueleto. Então, vá em frente, pelo amor de Deus" (Le fabuleux destin d'Amélie Poulain)